22 setembro 2009

Reportagem 18

Quem é mais inteligente?

Estudos mostram que as mulheres têm capacidade intelectual maior do que a dos homens. Saiba quais são as habilidades delas e as deles.

Carina Rabelo e Rodrigo Cardoso



Durante décadas, o raciocínio lógico, medido pelos testes de QI, era a grande prova de inteligência. Neles, os homens sempre se saíram melhor do que as mulheres. Eles têm em média cinco pontos a mais no QI e na faixa dos 155 pontos - a dos gênios - há 5,5 representantes do sexo masculino para cada um do feminino.

Nos últimos anos, quando o conceito de inteligência começou a mudar e outras características como interação social, percepção do outro e capacidade de questionamento e argumentação passaram a ser valorizadas na sociedade, um novo olhar foi lançado sobre as aptidões e as habilidades femininas. Mas a dúvida persiste: quem é mais inteligente, o homem ou a mulher?

Uma pesquisa do professor José Abrantes, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que será publicada em livro em julho, conseguiu mensurar o desempenho de homens e mulheres nos 12 tipos de inteligência propostos por Howard Gardner, da Universidade de Boston, nos Estados Unidos (leia quadro à pág. 74), psicólogo que revolucionou esta área de estudo.

Depois de analisar 137 mil notas de 22 mil alunos do Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam), no Rio de Janeiro, ele concluiu: as mulheres são superiores em nove das 12 possibilidades de inteligência e, de acordo com a metodologia de sua pesquisa, 3% mais inteligentes porque obtiveram notas 3% superiores às dos homens. Outras constatações:

Entre as mulheres, há menor variação entre a maior e a menor nota. Isso acontece porque elas têm interesse em assuntos variados. O grupo feminino se destaca em física e química experimental. O masculino é melhor em física e química teórica, o que confirma nelas a visão periférica superior e a habilidade manual.

Em anatomia, os homens apresentaram médias mais altas, o que pode ser explicado pela melhor visão espacial deles. Nas disciplinas dança educacional e ginástica, que estão relacionadas à expressão corporal, as mulheres foram superiores. Os homens se sobressaem na destreza da articulação dos movimentos para atingir um objetivo, como é necessário no futebol, além da força física.

Na matemática, elas têm mais facilidade para aplicar fórmulas em cálculos, mas eles dominam o raciocínio, ou seja, têm melhor compreensão do processo lógico. Para verificar o nível de inteligência dos alunos através das notas, Abrantes relacionou cada disciplina às 12 possibilidades propostas por Gardner.

As matérias de humanas, por exemplo, são associadas às inteligências linguísticas e pessoais; as de exatas, às habilidades lógico-matemática e espacial; os cursos das áreas de artes são distribuídos pelas inteligências musicais, pictóricas e cinestésicas - esta última para os cursos de educação física e dança.

O cruzamento de dados considerou um número proporcional de homens e mulheres para cada curso analisado.

Um outro estudo realizado pela bióloga Marta Relvas, da Sociedade Brasileira de Neurociência, com 40 alunos do ensino fundamental, comprova as habilidades múltiplas do sexo feminino. O resultado foi publicado no livro Neurociência e educação. Potencialidades dos gêneros humanos na sala de aula, lançado em março.

A pesquisa revela que elas se sobressaem em testes de percepção, memória e coordenação motora, enquanto eles se dão melhor na relação com objetos tridimensionais, pontaria e no raciocínio matemático.

Isadora Labrada, 17 anos, e Sílvio Barbosa, 16, estudantes do terceiro ano do ensino médio, são exemplos das diferentes habilidades entre homens e mulheres. Ela se destaca pela organização e bom desempenho em todas as matérias.

Ele, pelas notas em química, física e matemática. "Sempre tive responsabilidade com os estudos e me interesso por assuntos variados", afirma Isadora, uma das melhores do Colégio Santa Maria, de São Paulo, que após as aulas ainda estuda flauta.

Aluno de outra escola paulista, o Colégio Santo Américo, Sílvio coleciona medalhas em olimpíadas de ciências naturais. "Não gosto das humanas porque não é possível prever os resultados", afirma. "Nas exatas, o raciocínio é lógico."

Para o professor Abrantes, a explicação é socioantropológica e remonta aos tempos das cavernas. "As mulheres eram obrigadas a desenvolver inteligências mais humanas", afirma. "Enquanto eles saíam para caçar, elas cuidavam dos filhos, da comida e conversavam entre si, desenvolvendo a linguagem."

Estudo da Universidade de Londres, publicado no ano passado, confirma que as mulheres são superiores no uso da inteligência emocional e da comunicação. Elas apresentam um vocabulário mais amplo desde os primeiros anos de vida e utilizam construções linguísticas mais complexas.

"As mulheres são melhores em tarefas múltiplas", afirma o neurologista Roger Gorski, autor do estudo.

A multiplicidade de interesses aproxima as mulheres da mais antiga fonte de conhecimento: a filosofia. Refletir sobre o mundo e o homem, ter curiosidade de compreender e questionar os valores sempre fizeram parte do universo de Tessa Lacerda, 34 anos, professora de filosofia moderna da Universidade de São Paulo (USP), amante da literatura e artes plásticas desde muito jovem.

No colégio, os questionamentos que se apresentavam em textos poéticos a direcionaram para este ramo do conhecimento. Segundo Tessa, entre familiares, ela é conhecida como a pessoa que faz todas as perguntas - e nunca apresenta soluções. Diante de situações triviais, ela assume suas dificuldades, como se localizar no trânsito, habilidade típica dos homens. "Há coisas incompreensíveis para mim, como ruas paralelas", afirma.

Os padrões evolutivos garantiram mutações na constituição genética. No livro Sex differences in cognitive abilities (As diferenças sexuais nas habilidades cognitivas), a psicóloga Diane Halpern, da Associação de Psicologia Americana, defende a superioridade das mulheres, argumentando que muitos dos genes relacionados às atividades cerebrais estão localizados no cromossomo X - os quais elas têm duas cópias, e eles apenas uma.

É justamente no cromossomo X que está a grande diferença no DNA dos gêmeos Camila e Roberto Rodrigues, 26 anos, que foram criados da mesma forma e receberam estímulos semelhantes desde a infância. Ela tem a inteligência intrapessoal mais desenvolvida.

A arquiteta Camila conta que, quando sofre um revés, reage de pronto. O irmão, por sua vez, demora para maturar uma atitude positiva em relação ao futuro. "Ele é mais indeciso, mais pessimista nessas horas e só pega no tranco", diz ela.

A arquiteta é capaz de passar horas ouvindo e aconselhando amigas, características da inteligência interpessoal. Já Roberto, professor de educação física, diz não ter paciência. "A Camila é extrovertida e faz amizade rapidamente.

Eu sou retraído e não tenho paciência para dar conselhos", afirma ele. "As mulheres são mais atentas às pessoas, os homens às coisas", explica o psicólogo evolucionista David Geary, que pesquisa a evolução das diferenças entre os sexos. Segundo ele, a partir dos seis meses, as meninas percebem sinais de aflição nos outros, identificam sons variados, gestos e sinais de perigo. Os meninos são mais indiferentes às pessoas, com atenção para objetos luminosos e de formas inusitadas.

No livro The essencial difference (A diferença essencial), o psiquiatra Simon Baron-Cohen afirma que o cérebro feminino desenvolveu maior habilidade para a empatia do que o masculino. As mulheres têm uma capacidade mais aguçada para identificar as emoções e sentimentos dos outros, prever ações e responder a elas com a emoção apropriada. Nelas, os circuitos ligados à audição e à linguagem têm 11% mais neurônios do que nos homens. A estrutura relacionada à emoção e à formação da memória também é maior.

Estudos recentes sugerem que a inteligência está relacionada à trajetória da informação pelo cérebro. Os neurocientistas Richard Haier, da Universidade da Califórnia, e Rex Jung, da Universidade do Novo México, revelam que algumas das áreas do cérebro relativas à inteligência são as mesmas da atenção, da memória e das funções da linguagem - zonas mais desenvolvidas nas mulheres.

A capacidade de executar com facilidade tarefas variadas ocorre porque o cérebro da mulher é 10% menor do que o dos homens. O espaço comprimido favorece um número maior de sinapses - 30% a mais do que eles. Elas também detêm um equipamento sensorial mais desenvolvido e uma habilidade maior para captar sinais não verbais. Além disso, as conexões cerebrais das mulheres ocorrem entre os dois hemisférios.

Nos homens, a atividade é mais intensa no lado esquerdo. "O cérebro deles é mais focado e adaptado para realizar uma tarefa de cada vez", afirma o neurologista Roger Gorski.

A estrutura da inteligência entre homens e mulheres não é rígida. Sofre alterações com as influências do meio, dos estímulos externos e da constituição cerebral do próprio indivíduo, que pode ter o tipo cerebral do sexo oposto. No livro Como as mulheres pensam, a neuropsiquiatra Louann Brizendine afirma que cerca de 20% dos homens têm cérebros estruturados de modo feminino e 10% delas têm cérebros masculinizados.

Quando se fala na superioridade da inteligência das mulheres, não é raro que os homens questionem a representação minoritária delas em cargos de chefia, na elite da comunidade científica e como homenageadas em prêmios das diversas áreas. Além do machismo histórico da sociedade, a opção pela família e pela maternidade é um fator decisivo.

Ao se tornar mãe, é comum a mulher tirar o pé do acelerador quando está em jogo a competitividade necessária para chegar ao topo. "Quando as mulheres desenvolverem maior autoconfiança e perceberem que a família não exclui a luta pelo sucesso, elas vão dominar o mundo", aposta José Abrantes. O instrumental elas já possuem.

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