21 abril 2011

Reportagem 27






Sexo virtual faz bem e colabora para o autoconhecimento.



Se cada um soubesse o que cada um faz dentro de quatro paredes, ninguém se cumprimentava. O que diria o dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980), autor da célebre frase, sobre tudo aquilo que homens e mulheres têm feito diante do computador? De conversinhas cheias de malícia entre amigos no MSN a sessões de masturbação via câmera, a tecnologia se transformou em uma ferramenta e tanto para ter, dar e receber prazer.

O sexo virtual dispensa apresentações, literalmente. “As pessoas podem se manter no anonimato e inventar o que quiserem para tentar impressionar o outro. Esse lado é muito excitante e interessante”, comenta a sexóloga Carla Cecarello, de São Paulo, que também vê como vantagem da prática o fato de a imaginação ficar mais solta. “Não mostrar a cara significa maior liberdade. Mesmo através da webcam, o fato de não estar ao vivo e em cores já favorece o desprendimento", diz ela. "As palavras podem fluir sem nenhuma censura, inclusive palavrões. Elas excitam bastante, pois remetem a situações de libertinagem”, completa.

Para Daniela Mantegari, co-autora do livro “Amar.com” (Ed. Gente), por trás das palavras as pessoas constroem castelos imaginários e se soltam mais. “A conversa convencional pode passar para um nível erótico, o que é bastante excitante. Isso não acontece geralmente quando se está cara a cara com alguém”, afirma. E isso pode ocorrer até entre casais juntos há muito tempo!

Já o jornalista Fabiano Rampazzo, que dá dicas para o público masculino transformar a paquera virtual em real em “Xaveco Pontocom” (Matrix Editora), acredita que outro fator positivo é o fato de o computador servir de estímulo para a confissão (e até a concretização, dependendo do caso) de determinados fetiches.

“Existem fantasias que determinadas pessoas não têm coragem de colocar em prática ou sequer revelar para o namorado ou namorada. A web traz alguns fetiches à tona e permite realizá-los com um certo prazer, de algum modo”, pontua. Fabiano diz ainda que a internet dispensa algumas exigências, como estar “arrumadinho, bonito e cheiroso” –características essenciais para um encontro real ou à caça de parceiros na balada. O que vale, na web, é a imaginação.

“Se a pessoa tem baixa autoestima, o sexo virtual vai ajudar nesse momento. Como não existe a presença física do parceiro, isso faz que seus pontos fracos não apareçam. A pessoa, então, se sente mais desejada”, comenta Daniela Mantegari. Já a administradora de empresas e publicitária Erica Queiroz, autora de “O Amor Está na Rede” (M. Books), acredita que o sexo virtual tem um grande número de adeptos porque "funciona como uma espécie de esquenta”.

“É um aperitivo para o que vai rolar concretamente”, afirma. Ela avisa que é importante que as pessoas saibam, de fato, o que querem e o que buscam antes de partir para essas experiências. “Se uma garota quer arrumar um namoro sério, não pode criar expectativas em relação a alguém que conhece em um chat com conteúdo sexual. Se a história começa com sexo, dificilmente vai sair disso”, ressalta.

A troca de mensagens ou imagens libidinosas também serve para apimentar o relacionamento de casais estáveis, segundo os especialistas, e para preparar a imaginação para o que pode vir a acontecer no plano real. Para a psicóloga Andrea Jotta, do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (NPPI/PUC-SP), o maior benefício que o sexo virtual pode proporcionar é o autoconhecimento. E ela tem uma teoria interessante...

“Costumo dizer que esse tipo de sexo, na verdade, é uma masturbação animada. Trata-se de fazer sexo consigo mesmo. Porque tudo depende da sua fantasia e do jogo de sedução que você pode criar. É uma espécie de treino, em que as pessoas vão testando seus limites e depois os transpassam para a vida real”, argumenta.

Real e virtual

Segundo Andrea, entretanto, para desfrutar plenamente do erotismo proporcionado pela internet é preciso ter um grau de maturidade avançado o suficiente para distinguir o que é virtual é o que é real. “Nem sempre a realidade vai ser tão boa quanto a fantasia criada no MSN, por exemplo”, salienta a psicóloga. “Isso porque, como expliquei, no sexo virtual você faz sexo com você mesmo. Na vida, é melhor ter consciência de que não vai ser igual. Afinal, o outro não estará dentro da sua mente.”

A prática do sexo virtual pode, sim, ser deliciosa, mas é preciso tomar alguns cuidados. “Vários estudos já mostraram que pessoas que fazem sexo virtual acabam por se isolar, ficam viciadas na masturbação e passam a não interagir com o outro, dificultando a abordagem ao vivo. Brincar de vez em quando é bem diferente de fazer sexo virtual”, adverte a sexóloga Carla Cecarello.

Segundo ela, é preciso ficar atento quando o comportamento passa a ser exacerbado. "Qualquer atividade diante do computador que comece a se tornar viciante ou mais importante do que as atividades da vida presencial denota um uso nocivo e, em muitos casos, exige tratamento psicológico”. Não custa lembrar um problema sério: o envolvimento de menores em práticas sexuais é crime. Caso suspeite de algo, denuncie.